A MINHA HOMENAGEM AO PROFESSOR MÁRIO MONIZ PEREIRA


Sempre tive pelo Prof. Mário Moniz Pereira uma profunda admiração e respeito. A sua vida é um verdadeiro exemplo de dedicação, excelência, amor, persistência e sucesso. Pretendo aqui deixar a minha pequena homenagem a este Grande Senhor do Desporto Nacional e da Cultura Portuguesa, personalidade impar que muito contribuiu para a projecção do nosso país, além fronteiras.

O seu nome está associado aos maiores êxitos do desporto do nosso país. É o treinador português cujos atletas melhores resultados desportivos alcançaram em todo o historial do desporto nacional. Quem não se lembra de nomes como o de Carlos Lopes, este fabuloso atleta, tri-campeão do mundo de corta-mato, vice-campeão olímpico dos 10.000 metros em Montreal (1976) e campeão olímpico da maratona em Los Angeles (1984)? Quem não se lembra de Fernando Mamede e do seu recorde mundial dos 10.000 metros? Quem não se lembra de tantos outros como: José Carvalho, Anacleto Pinto, Aniceto Simões, Hélder de Jesus, Domingos Castro, e tantos outros?

O Prof. Moniz Pereira, ou o "Senhor Atletismo Português", tal como era conhecido, exerceu uma influência marcante não só no Atletismo, mas também em todo o desporto nacional. A excelência da sua prática, tanto humana como técnica, aliada uma rara determinação e capacidade de acreditar no seu trabalho, contribuíram para uma nova visão das reais capacidades dos atletas não só do Atletismo, mas de todas as outras modalidades, aquando da realização de competições internacionais.

Revejo-me em 1975, altura em que os atletas portugueses, por influência do Prof. Moniz Pereira, junto do Governo Português, começaram a usufruir de melhores condições de treino, embora não as ideais. “Eu sabia” - dizia ele -, “que os nossos atletas fariam resultados de categoria internacional, se lhes fossem dadas condições de treino parecidas com as dos seus adversários estrangeiros. Tendo em vista os Jogos de Montreal, em 1976, o Prof. Moniz Pereira, elaborou o Plano de Preparação Olímpica. Estávamos a pouco menos de um ano dos Jogos, mais precisamente em Setembro de 1975. O tempo era reduzido, mas o Prof. Moniz Pereira acreditava que era possível ir mais longe. No entanto, ecos de alguma imprensa, de "antigos velhos do Restelo", duvidavam das capacidades dos nossos atletas. Em Montreal, no entanto, os resultados ultrapassaram todas as expectativas: Lopes é vice-campeão olímpico, nos 10 000 metros, atrás do finlandês Viren; José Carvalho é 5º, nos 400 metros barreiras, Aniceto Simões é 8º, na final dos 5.000 metros, obtendo os restantes atletas resultados de verdadeira categoria internacional. Resta fazer aqui um parênteses, Lopes só não é primeiro porque Viren, o tal finlandês, tinha tomado, dias antes, um copo de “leite de rena”… *

Mas, para melhor conhecer o Prof. Mário Moniz Pereira, gostaria de referir um breve episódio que ilustra, significativamente, a sua filosofia de vida. Num colóquio realizado em França, em Novembro de 1985, perante uma vasta assistência de treinadores de meio fundo, o Prof. referia o seguinte: "Na vida, nada de grande se pode fazer sem amor. A paixão pela modalidade é a causa mais importante para o sucesso de um treinador." O Prof. Moniz Pereira era um apaixonado, não só pelo atletismo, mas também pela vida. Penso que foi esta grande paixão e este grande amor pela vida que o Prof. Moniz Pereira soube transmitir, como ninguém, não só aos seus atletas, mas também a todos aqueles que tiveram o privilégio da sua presença. "Transmitir aos atletas o gosto pelo treino, julgo ter sido a melhor coisa que fiz”, disse ele.

Tive o privilégio de conviver com o Prof. Moniz Pereira durante os anos em que estive ligado ao atletismo, por mais de duas décadas. A sua presença nos diferentes campeonatos nacionais, em todas as categorias, era uma constante. Era uma pessoa simpática e acessível, contrariando um pouco a ideia que se pode ter de alguém que é “um mito vivo”. Para além disso, fiz algumas acções de formação com o Professor, lembrando-me especialmente de uma realizada nas Açoteias em 1984 (Estágio de Meio Fundo e Fundo), com a presença de alguns atletas açorianos, nomeadamente Néné Carreiro e Pedro Soares.

Em 2013, procurei trazer o Prof. Moniz Pereira a S. Miguel para uma conferência. Telefonei-lhe e estive na sua casa, perto de Entre Campos. Na altura, e com 92 anos, tinha ainda uma agenda preenchidíssima que o impediu de vir. Coisas do seu “Sporting Clube de Portugal”. Um ano depois, já não foi possível o contacto direto via telefone. Recorro à sua filha, a Professora Leonor Moniz Pereira, minha antiga professora no ISEF. Já prevejo a impossibilidade, por motivos de saúde, da vinda do professor a S. Miguel. Posteriormente, tenho a confirmação. No entanto faço-lhe um último pedido: gostaria que o professor me autografasse o seu livro “Carlos Lopes e a Escola Portuguesa do Meio Fundo”. (Tive tantas oportunidades de concretizar este meu desejo, mas nunca me lembrei de o fazer). Vou a Lisboa e num circunstancialismo feliz, sou recebido pelo professor que me assina o livro. Tenho-o religiosamente guardado como relíquia. A assinatura do professor veio completar o ciclo, pois em Dezembro de 2013 consegui que o Carlos Lopes, presente na nossa S. Silvestre como convidado de honra, também o assinasse.

O Prof. Mário Moniz Pereira integra a galeria dos treinadores que fizeram história no atletismo mundial, e nós, portugueses, sentimo-nos orgulhosos disso. Por tudo aquilo que fez ao serviço do Atletismo e por Portugal, o país deve-lhe o maior respeito e a mais elevada gratidão. Portugal está de luto.

* Viren era suspeito de fazer transfusões de sangue para melhorar o seu rendimento, mas atribuía as seus performances ao facto de beber leite de rena.

Artigo publicado no Jornal Correio dos Açores, na edição do dia 7 de agosto de 2016.